sábado, 30 de outubro de 2010

A felicidade do Jabor



Saiu no Globo de hoje uma análise (com cara de desabafo) do Zuenir Ventura sobre A Suprema Felicidade, de Arnaldo Jabor. Zuenir aproveita para dar umas alfinetadas bem dadas no crápula do Jabor.


A felicidade do Jabor

Gosto de Arnaldo Jabor ao ponto e até mal passado — desde a Urca dos anos 60, quando fomos vizinhos. Lá ele já exercitava seu espírito fraterno. Um dia parou com uma Kombi na porta de casa, me apanhou e fomos recolher colchões e roupas para os desabrigados da grande enchente de 1966 acampados na PUC. Corta, e vinte anos depois eu presenciava como enviado especial do "Jornal do Brasil" o seu sucesso em Cannes com "Eu sei que vou te amar", que consagrou Fernandinha Torres como a melhor atriz do festival. Fui testemunha desse momento de glória do cinema brasileiro. Apesar de difícil (um casal discutindo a relação como numa psicanálise), o filme teve surpreendente bilheteria.

Mas Jabor continuava com dificuldades financeiras. Bem antes, em meados dos anos 70, ele apareceu na sucursal da revista "Visão", de cuja redação eu era chefe, para pedir uma colaboração (um freelance) porque estava necessitando de grana. O Aeroporto Tom Jobim se encontrava em obras, e eu, na maldade, achei que uma reportagem ali, em pleno verão, seria um bom teste para um candidato a foca. Cineasta já respeitado, ele passou a tarde na pista, com um sol de 50 graus, e trouxe uma matéria impecável, sem dar um pio, e na maior humildade — que não é sua principal virtude. Até hoje ele diz que foi seu "primeiro frila" e eu minto dizendo que ele aprendeu jornalismo comigo. Em 1994, escolhi como epígrafe de meu livro "Cidade partida" uma frase sua: "O Rio é o trailer do Brasil."

Tudo isso me voltou à lembrança pela viagem que realizei vendo o seu "Felicidade suprema", delicado, terno, cativante. É um filme completamente diferente do Jabor de que menos gosto, o destes últimos tempos — o Jabor enragé, salvacionista, anunciando o apocalipse se não for feita sua vontade política. É o militante panfletário que convoca os jornalistas para embarcar na sua cruzada, como se, em vez de testemunhas, devêssemos ser cabos eleitorais. Depois, frustrado, ele se deprime, sofre e somatiza o sofrimento, parecendo que o país, o mundo e até ele vão acabar. Outro dia, após uma dessas profecias terminais, um amigo comum comentou, meio à brinca e meio a sério: "Tou com medo do Jabor se suicidar." Quando soube disso, o também cineasta Cacá Diegues, que o considera como um irmão, tranquilizou: "Não tem o menor perigo. Jabor gosta demais dele mesmo." É verdade. Mas para que o diretor de "Suprema felicidade" seja feliz no Brasil de hoje, não apenas no do passado, ele está precisando ouvir a lição do avô, sábio personagem interpretado por um genial Marco Nanini: "A vida gosta de quem gosta dela."

2 comentários:

  1. Muito Show! Deu até saudades dos tempos de Facha ...

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  2. Hehehe
    valeu, barolli! agora me senti o próprio ivo luchesi.

    abs!

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