sábado, 20 de junho de 2009

Xico Buark me visita




Em comemoração aos 65 anos de Chico Buarque, completados ontem, decidi ceder este espaço para que uma de suas maiores fãs pudesse falar um pouco de seu objeto de admiração. A tiete em questão não é qualquer uma, trata-se de Clarice Lispector, e o texto saiu originalmente em sua coluna no Jornal do Brasil, em junho de 1971. Na época, Chico tinha acabado de completar 27, e já acumulava um repertório com clássicos definitivos da MPB, incluindo Retrato em Branco e Preto, Roda Viva, Pois É, Apesar de Você, Sabiá e Construção. Nada mal, hein?

"Essa grafia. Xico Buark, foi inventada por Millôr Fernandes, numa noite no Antonio's. Gostei como quando eu brincava com palavras em criança. Quanto ao Chico, apenas sorriu um sorriso duplo : um por achar engraçado, outro mecânico e tristonho de quem foi aniquilado pela fama. Se Xico Buark não combina com a figura pura e um pouco melancólica de Chico, combina com a qualidade que ele tem de deixar os outros o chamarem e ele vir, com a capacidade que tem de sorrir conservando muitas vezes os olhos verdes abertos e sem riso. Não é um garoto, mas se existisse no reino animal um bicho pensativo e belo e eternamente jovem que se chamasse garoto, Francisco Buarque de Holanda seria dessa raça montanhosa.

Gostei tanto de Chico que o convidei para a minha casa. Com simplicidade ele aceitou.

Apareceu perto das quatro da tarde: naquele tempo, às cinco horas tinha uma lição de música com Vilma Graça, e havia um ano que estava estudando Teoria Musical, para depois estudar piano.

Quantos momentos decisivos na sua vida, é muito moço para saber se eram de fato decisivos esses momentos, se no final das contas contaram ou não. Nasceu com a estrela na testa: tudo lhe correu fácil e natural como um riacho de roça. Para ele, criar não é muito laborioso. Às vezes está procurando criar alguma coisa e dorme pensando nisso, acorda pensando nisso ---- e nada. Em geral cansa e desiste. No outro dia a coisa estoura e qualquer pessoa pensaria que era gratuita, nascida naquele momento. Mas essa explosão vem do trabalho anterior inconsciente e aparentemente negativo.

O problema lhe interessa: fez-me várias perguntas sobre meu modo de trabalhar. Eu lhe disse: "Você, apesar de rapaz que veio de cidade grande e de uma família erudita, dá impressão de que se deslumbrou ao mesmo tempo em que deslumbra os outros com sua fala particular: já se habituou ao sucesso? Dá impressão de que você se deslumbrou com as próprias capacidades, entrou numa roda-viva e ainda não pôs os pés no chão ".

Chico acha que tem cara de bobo porque suas reações são muito lentas, mas que no fundo é um vivo. Só que pôr os pés no chão no sentido prático o atrapalha um pouco. Acha que o sucesso faz parte dessas coisas exteriores que não contribuem em nada para ele:

A pessoa tem sua vaidade, alegra-se, mas isso não é importante. Importante é aquele sofrimento de quem procura buscar e achar. Hoje, disse-me, acordei com um sofrimento de vazio danado porque ontem terminei um trabalho.

Falamos do processo de criar de Vila-Lobos e ele contou uma frase dele dita a Tom Jobim: Villa-Lobos estava um dia trabalhando em sua casa e havia uma balbúrdia danada em volta. O Tom perguntou: "Como é, maestro, isso não atrapalha?" Ele respondeu: "O ouvido de fora não tem nada a ver com o ouvido de dentro.” E isso Chico invejava. Também gostaria de não ter prazo para entrega das músicas, e de não fazer sucesso: ele é interrompido nas ruas e nas ruas mesmo é obrigado a dar autógrafos.

Chico tem um ar de bom rapaz, esses que todas as mães com filhas casadoiras gostariam de ter como genro. Esse ar de bom rapaz vem da bondade misturada com bom humor, melancolia e honestidade. Tem o ar crédulo, mas diz que não é, é apenas muito preguiçoso.

Claro que gostou quando o maestro Isaac Karabtchevsky dirigiu a banda no Teatro Municipal, mas o que lhe interessa mesmo é criar. Desde pequeno faz versinhos. Pedi-lhe que fizesse assim de improviso um versinho e que, para pô-lo à vontade, eu esperaria na copa. Daí minutos Chico chamou, rindo: Como Clarice pedisse/ Um versinho que eu não disse/ me dei mal/ Ficou lá dentro esperando /mas deixou deu olho olhando / Com cara de Juízo Final.

Perguntei-lhe se já experimentara sentir-se em solidão ou se sua vida tinha sempre esse brilho justificável. Eu aconselhei que de vez em quando ficasse sozinho, senão seria submergido, pois até o amor excessivo dos outros podia submergir uma pessoa. Ele concordou e disse que sempre que podia dava suas retiradas.

Logo que entrou para Arquitetura, quando começou a trocar a régua pelo violão, a coisa parecia vagabundagem mas depois a família se conformou.

Estava em fase de procura e no dia anterior acabara um trabalho que era só de música, que exigia prazo. Mas para uma canção nova estava sempre disponível. A coisa mais importante para Chico é trabalho e amor, e, como indivíduo, quer exatamente Ter a liberdade para trabalhar e amar. De brincadeira perguntei-lhe o que era amor. "Não sei definir", disse-me, "e você?" " Nem eu", respondi."




quinta-feira, 18 de junho de 2009

Esculpido e encarnado


Some uma paixão, uma doença mortal e mais uma pitada de talento, o resultado será a história surreal do escultor japonês Hananuma Masakichi (1832-1895). Após ser diagnosticado com tuberculose, Masakichi sabia que não duraria muito tempo. Acuado por um destino trágico, ele então resolveu que faria sua última grande obra: uma verdadeira prova de amor à sua mulher. Masakishi esculpiria na madeira uma cópia perfeita de si próprio. Para alcançar o máximo de realismo, ele arrancou seus fios de cabelo, unhas e dentes para recolocar, um a um, cuidadosamente, na mesma posição, na escultura. Além disso, pintou e laqueou a superfície da madeira para que se parecesse com pele humana. Os olhos foram feitos com extrema precisão ótica. E ele ainda lançou mão de uma série de artifícios para aumentar a ilusão de realidade.

A história de amor, no entanto, tem um desenlace inusitado. Após terminar a empreitada, Masakichi se descobriu curado da tuberculose. Ou por outra, fora vítima de um diagnóstico errado. O fato é que o japonês recuperou a saúde e viveu bastante, até morrer idoso, aos 63 anos. Mas o lado irônico é que perdeu sua amante.

Anos após sua morte, sua escultura foi arrematada, em 1934, por um americano afeito a relíquias bizarras, chamado Robert Ripley. Até hoje a obra faz parte do museu Ripley, aquele do Acredite Se Quiser.

A história incrível de Masakichi me lembrou um artigo escrito por mim um tempo atrás sobre hiperrealismo.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Show de calouros

Há tempos a internet tornou-se um extenso palco para todo tipo de talento. As vezes o que conta é justamente a falta dele. Mas esse não é o caso da picurrucha Christney Spears, que tem talento de sobra para a comédia.